As
relações laborais tentam acompanhar os avanços tecnológicos, mas o
monitoramento no ambiente do trabalho tem implicado desdobramentos
peculiares nas relações entre patrões e empregados, exigindo da Justiça
do Trabalho uma nova visão doutrinária, jurisprudencial e legal sobre a
questão.
Somos
hoje constantemente vigiados. Em shoppings, edifícios ou nas ruas,
câmeras monitoram nossas vidas e, pela Internet, empresas vasculham
nossos interesses, sendo quase impossível a privacidade. Também no
âmbito do trabalho, o uso de câmeras de vigilância está cada vez mais
comum, somente sendo proibido em banheiros e refeitórios. Todavia, seu
uso ostensivo pode representar abuso do poder de fiscalização e
acarretar ofensa à honra e à intimidade do trabalhador.
O
monitoramento por imagens há algum tempo tem sido fonte de conflito
entre patrões e trabalhadores, da mesma forma que o controle de emails e
as escutas e gravações de ligações telefônicas dos empregados. São
questões que a justiça trabalhista está aprendendo a contemporizar, já
que demonstram alterar a convivência no ambiente de trabalho e dizem
respeito à saúde do trabalhador. Para o professor de psicologia da
Universidade de Brasília (UnB), Wanderley Codo, tudo indica que existem
sim influências nocivas para o trabalhador com este tipo de vigilância,
no entanto ainda não há bons estudos que comprovem que o uso ostensivo
de câmeras influencia ou não a psique do trabalhador. Teríamos que
colocar dois grupos de trabalhadores, um vigado por câmeras, outro não,
para poder avaliar o problema, e acredito que isso ainda não tenha sido
feito até hoje, afirmou. Para o professor, seria muito bom se as
entidades jurídicas pudessem propor esses estudos.
A
discussão, apesar de trabalhista, gera debates sociais, por serem
privacidade e intimidade palavras normalmente reservadas à vida pessoal.
Contudo, pedidos de indenizações nesse sentido são cada vez mais comuns
hoje em dia (artigo 5º, inciso X da Constituição). A jurisprudência diz
que o monitoramento eletrônico representa poder diretivo do empregador e
não constitui violação à intimidade, à vida privada ou à dignidade da
pessoa, salvo se for excessiva, ostensiva ou com o fim de constranger os
empregados.
As
empresas se defendem afirmando que o uso de câmeras visa à segurança
dos trabalhadores e à proteção do patrimônio empresarial. Somos
constantemente vigiados. Se conversamos com os colegas, se mexemos nos
nossos celulares e, principalmente, quando levantamos para ir ao
banheiro, sabemos que tudo está sendo visto, desabafa uma ex-empregada
de call center que entrou na Justiça do Trabalho contra empresa após ter
sido diagnosticada com depressão e síndrome de pânico. Me sentia uma
prisioneira. Ela conta que o chefe no final do expediente chamava quem
ele achasse que tivesse apresentado comportamento fora do normal.
Pela
jurisprudência dominante no TST, é devida a indenização por danos
morais quando há abuso do poder, ou seja, a filmagem não pode ser forma
ostensiva, e o funcionário deve ter conhecimento dos dispositivos de
segurança. Para fixar o valor da indenização, o magistrado leva em conta
critérios como proporcionalidade, razoabilidade, da justiça e da
equidade. Não há norma legal que estabeleça a forma de cálculo a ser
utilizada para resolver a controvérsia. O valor varia conforme o caso e a
sensibilidade do julgador, ou seja, de maneira subjetiva.
Prova
Todavia,
o sistema de vigilância pode ser usado também como meio de prova. Esse
foi o entendimento da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que
considerou lícita a filmagem feita por uma empresa de saneamento, com o
objetivo de provar que um empregado não estava incapacitado para o
serviço, como alegou ao ser dispensado. De acordo com o TRT, afora a
perícia médica, nem sempre infalível, não havia mesmo outro caminho, a
não ser a filmagem, para demonstrar a verdade.
Mas
e se uma babá tiver suas atividades secretamente monitoradas pela
patroa, isso representaria abuso do poder de fiscalização? É o que uma
trabalhadora de Porto Alegre (RS) tenta provar há dois anos, quando
decidiu procurar a Justiça ao perceber que estava sendo filmada
secretamente pelos patrões. Ela descobriu o dispositivo sem querer e
contou para o marido. Os dois buscaram orientação de um advogado. Os
patrões foram acionados e tiveram de se explicar.
O
uso banalizado de aparelhos de filmagem, a oferta de produtos e
facilidade de utilizá-los é tão grande que basta uma busca na internet
para acharmos empresas especializadas em vigilância de babás e
empregados domésticos. Para
quem defende o uso, esse é um direito dos pais, e não representaria uma
violação da privacidade da babá, desde que o aparelho não seja instalado
no quarto da funcionária. Do contrário, dizem, ajuda a acompanhar a
rotina, monitorar o aprendizado e as brincadeiras.
Se
a utilização é realmente uma rotina, não se pode pretender que as
empresas estejam alheias a essa realidade. Contudo, faz pensar que
princípios basilares da relação de emprego, como boa-fé e respeito mútuo
sejam mediados com a utilização de tecnologias, e não pelas relações
interpessoais. Muitos se perguntam se não seria necessária uma
regulamentação de normas para o controle do uso de câmeras e para a
busca de um ambiente de trabalho harmonioso.
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho
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