A
roda de mate é manifestação cultural que faz agrupar pessoas sem
distinção de raça, credo, cor, posse material. Parece claro que a
escolha da companhia do chimarrão não pode ser associada a intimidades
ou mesmo a amizades comuns. Foi esse o entendimento do juiz Rodrigo
Trindade de Souza, substituto na 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre,
ao indeferir contradita de testemunha apresentada por dois réus em uma
ação trabalhista. Nesse tipo de pedido, uma das partes no processo
argumenta que a testemunha indicada pela parte contrária não pode
prestar depoimento por não ser isenta o suficiente. Amizade íntima,
inimizade capital ou parentesco com a parte, além de interesse pessoal
no processo, são situações que, quando comprovadas, impedem que o
depoimento de uma testemunha seja utilizado como prova em uma ação
judicial.
No
caso analisado pelo juiz, as reclamadas alegaram que a testemunha
contraditada era amiga íntima do trabalhador e, portanto, não poderia
depor a favor dele. As testemunhas convidadas pelas empresas para
confirmar essa alegação, no entanto, afirmaram que viam a testemunha
contraditada tomando chimarrão com o reclamante, mas apenas
ocasionalmente. A inusitada situação que se apresenta é de se perquirir
se o hábito de matear com outra pessoa é significativo de intimidade
suficiente a se afastar presunção de depoimento, explicou o juiz.
Para
embasar seu entendimento, o magistrado argumentou que, nas lendas dos
índios Guaranis, o chimarrão é uma forma de retribuição oferecida por
viajantes desconhecidos, em troca da hospitalidade e bom tratamento
recebidos nos lugares onde passaram. Dos imemoriais tempos
pré-colombianos, passando pelos espanhóis conquistadores, até a formação
do hábito no Rio Grande do Sul, a característica do chimarrão como
símbolo da hospitalidade a todos prevalece, afirmou o julgador. O
chamado mate de roda continua sendo servido a qualquer visitante,
independentemente de obrigatoriedades e intimidade, concluiu o juiz.
O
magistrado também fez referência ao conto O mate do João Cardoso, do
escritor gaúcho João Simões Lopes Neto. Na história, o personagem recebe
todos que aparecem para longos mates, e utiliza o expediente de demorar
ao tomar o chimarrão para obter mais tempo na companhia do
desconhecido.
Processo 0000106-11.2010.5.04.0022
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
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