As
ações que chegam à Justiça do Trabalho mineira são o termômetro de uma
realidade alarmante: os professores estão ficando reféns de alunos sem
limites e de instituições de ensino omissas, mais preocupadas com o
lucro do que com a formação ética dos estudantes. A visão mercantilista
da educação tem sido a responsável por situações absurdas, em que a
violência psíquica e física ganha o aval das direções e coordenações de
muitas instituições de ensino, pela falta de repreensão e de sanções
adequadas aos alunos rebeldes. É que muitas delas são mantidas e
financiadas pelas mensalidades dos estudantes. Em consequência, elas
preferem acobertar o comportamento inadequado de alunos rebeldes do que
perder uma fonte de lucro. Sob essa ótica, o aluno é tratado como um
cliente, que sempre tem razão, enquanto o professor é visto como um
simples empregado, que pode ser substituído com facilidade, e, por essa
razão, ele é obrigado a tolerar o desrespeito.
O
resultado disso pode ser observado também nos meios de comunicação, que
frequentemente noticiam situações de total desrespeito ao profissional
da educação. Já se tornaram comuns as notícias de professores agredidos e
até mesmo assassinados em salas de aula por motivos banais, como, por
exemplo, a insatisfação do aluno por causa de uma nota baixa. É com esse
clima hostil em seu ambiente de trabalho que muitos professores estão
exercendo suas funções. Esse tema foi objeto de análise do juiz
substituto Daniel Cordeiro Gazola. Na 29ª Vara do Trabalho de Belo
Horizonte, ele julgou a ação proposta por um professor, dispensado por
justa causa, sob a acusação de ter maltratado uma aluna. Mas, depois de
examinar o conjunto de provas, o magistrado descobriu que, na realidade,
a vítima foi o professor, que foi hostilizado por um grupo de
estudantes liderados e influenciados pela aluna rebelde.
De
acordo com os relatos do reclamante, havia na instituição de ensino uma
aluna problemática, que apresentava um comportamento atípico, gerando
grande dificuldade na interação professor-aluno. Ele contou que a aluna
rebelde insistia em tratá-lo de forma hostil e desrespeitosa, pois
sempre gritava em sala de aula, reagia com ironia à sua atuação como
professor e falava ao celular em tom de provocação e intimidação,
contaminando toda a atmosfera da sala de aula, porque prejudicava os
demais colegas. Na tentativa de solucionar esses problemas
disciplinares, o professor comunicou à coordenação do curso os
transtornos causados pela aluna, mas, conforme relatou, a empregadora
não se posicionou a respeito de suas queixas. De acordo com as alegações
do professor, como a escola não adotou qualquer medida efetiva para
conter os abusos da aluna, os episódios de desrespeito foram se tornando
recorrentes e passaram a atingir também os demais alunos da sala que
demonstravam interesse nas aulas. O reclamante contou que a própria
escola já precisou socorrer uma estudante agredida fisicamente pela
aluna rebelde. Dessa forma, os problemas foram se repetindo até o dia em
que o professor reagiu, rispidamente, às provocações da aluna, sendo
acusado, por isso, de adotar comportamento inadequado e desrespeitoso no
local de trabalho, o que resultou na sua dispensa por justa causa.
Na
avaliação do juiz, os fatos relatados pelo reclamante foram confirmados
nos depoimentos colhidos no processo, tendo as testemunhas revelado em
detalhes os acontecimentos que se sucederam até a dispensa do professor.
Uma testemunha, ex-aluna do curso de Técnico em Segurança do Trabalho,
declarou que o grupo liderado pela estudante rebelde estava em sala de
aula apenas para desorganizar e tumultuar o ambiente. Segundo a
testemunha, o comportamento desses alunos era provocativo, tentando dar a
impressão de que o professor não tinha conhecimento bastante para estar
lecionando e, algumas vezes, com provocações pessoais indiretas, como,
por exemplo, a respeito de sua sexualidade. Essa testemunha informou
que, juntamente com vários colegas, chegou a pedir à direção para mudar
de turma, devido ao clima hostil, no que foi atendida. De acordo com os
depoimentos, no dia do incidente que motivou a justa causa, o professor
chegou um pouco atrasado e a aluna problemática gritou para todo mundo
ouvir a expressão chegou a margarida. O reclamante repreendeu a atitude e
respondeu que havia escutado os latidos da aluna. Por causa disso, ela
registrou um boletim de ocorrência.
Para
o julgador ficou claro que toda aquela situação dava a entender que a
aluna problemática sempre conseguia respaldo da escola para continuar
com seu comportamento inadequado, porque jamais foi punida pelas suas
atitudes desrespeitosas para com o professor e com os colegas. O
magistrado entende que a instituição de ensino não poderia ter se
utilizado da informação contida no BO para dispensar o reclamante, por
justa causa, sem se preocupar em apurar os fatos e em conceder ao
empregado oportunidade de se defender da infeliz acusação. Infeliz
também é a constatação de que quem deveria elucidar tais fatos era a
própria reclamada, mediante sindicância específica para isso, não este
Juízo, lamentou o julgador. Assim, concluindo que a penalidade aplicada
ao professor foi desproporcional e injusta, o juiz sentenciante afastou a
justa causa, condenando a instituição de ensino ao pagamento das
parcelas típicas da dispensa imotivada. Conforme observou o julgador,
considerando que o contrato de trabalho do reclamante era por tempo
determinado, a rescisão antecipada gera o direito à indenização prevista
no artigo 479 da CLT, correspondente a 50% dos valores a que teria
direito até o término do contrato. Por unanimidade, a 6ª Turma do TRT-MG
deu provimento ao recurso do reclamante para acrescentar à condenação o
pagamento de uma indenização por danos morais, no valor de R$20.000,00.
(AIRR 0164200-70.2009.5.03.0108)
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região
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